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His(Es)tórias do Éd # 6 - A gatinha Magali

Preâmbulo


Isso foi há 7 anos. Foi bem no início de mês de fevereiro (posso afirmar com 95% de certeza que era no dia 6). Eu evito comentar sobre esse assunto, pois ninguém acredita. Nem a minha mãe acreditou.

Eu recém tinha me mudado para um lugar que ficaria conhecido como "Alberto House". Era um apartamento legalzinho. Desses que a gente chama de "apertamento". Tecnicamente era um sobrado, e aluguei a parte de cima. Eu era um humilde vendedor externo na época. Pelo fato de eu ser chinelão, pobre e andar a pé, vendia pouco, mas isso é outra história.

O apê estava um pouco bagunçado, devido à recente mudança. Gosto de tudo organizado em casa. Mas não gosto de organizar. Também não gosto de gatos em cima da minha cama. E a Magali sabia disso.


A Magali

A gatinha Magali


A Magali foi uma gatinha que adotei com poucos dias de vida, no mês de Outubro de 2005 (95% de certeza que foi no dia 22). Estava eu passando pela praça barão do Rio Branco, em Uruguaiana. No meio da praça, uma feira de animais. Todos estavam para adoção. Eu morava sozinho na época (meus primeiros meses morando sozinho) e tinha um gato e um cachorro que haviam ficado de herança. O gato tinha morrido atropelado uns dias antes. O cachorro seguia vivo. Eu não queria mais um animal para cuidar, pois não conseguia cuidar nem de mim. Mas mesmo assim parei para apreciar cachorros e gatos bonitinhos. Acabei voltando pra casa com a Magali (em homenagem à personagem da Turma da Mônica). 

Nesses curtos meses, da adoção da Magali quando eu estava na casa antiga, até o fato que aqui será narrado, que aconteceu na casa nova, ela aprendeu que poderia dormir na montanha de roupas sujas (entretanto era proibido cagar no meu edredon que aguardava lavagem), mas não poderia subir na minha cama. Mesmo assim, vez ou outra eu a surpreendia dormindo em minha cama (ela esperava eu sair para ir deitar-se). Coisa de gatos. E gatas.

Quem tem ou já teve gatos sabe o quanto eles gostam de uma casa-recém-chegado-de-mudança. Eles têm vários locais para se esconderem. Caixas vazias, coisas jogadas. Enfim, eles acham bons lugares para se acomodarem. Mas a minha cama, pelo visto, era muito convidativa.


Chegando em casa


Numa quente manhã de fevereiro, em pleno verão uruguaianense, chego ao meio-dia para almoçar. Eram os primeiros dias no apartamento novo. Nesse dia talvez eu até fosse almoçar um marmitex da Cantina do Bony, devido à bagunça da mudança (achar talheres, panelas, etc.). Não lembro se realmente o fiz. Abri a porta e entrei. Ao entrar, eu avistava minha cama, pois o quarto estava aberto. 

Da entrada avistei a Magali em minha cama. Ela se assustou e se levantou, pois não deve ter percebido minha chegada a tempo de sair. Porém, devido ao calor, cansaço, fome, etc. fiz pouco caso do fato de ela estar em minha cama, afinal de contas, como estava em clima de mudança ainda, coisas bagunçadas e tal, tinha coisas mais importantes para me preocupar. E também é bem provável que eu fosse lavar as roupas de cama. Ou seja, não me importei de ela estar em minha cama.

O Susto ( e o fato)


Quem mora sozinho e tem animais de estimação, mesmo que não tenha o hábito de conversar com eles, vez ou outra falará algo para os pets. É inevitável.

Ela se assustou ao me ver entrar, e levantou-se rapidamente. Eu simplesmente entrei, a vi, e disse: "Oi, Magali". Ao que ela respondeu "Oi...", levemente desconcertada por eu não estar brabo com ela. 

Foi um susto. Era a primeira vez na vida que tinha visto um gato falar (e até o presente momento, a única). Imediatamente fui até a cama e perguntei: "Tu falou ?". Magali então passou a se comportar como um felino, lambendo-se e ronronando. Porém não respondeu à minha pergunta. Achei tudo aquilo muito estranho, mas como tinha que voltar a trabalhar, almocei e voltei ao trabalho.

Eu não me recordo ao certo, mas é muito provável que eu tenha tentado conversar com ela de novo (dando "tchau", por exemplo). O fato é que ela não mais falou comigo.

E com ninguém mais. Magali morreu misteriosamente naquela noite, atropelada acidentalmente pelo carro de um amigo meu, que estacionava em frente à minha nova moradia.

R.I.P. Magali (Out 2005 - Fev 2006).

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