" A mente que não é treinada, é estúpida. As sensações surgem e a ludibriam com a alegria ou a tristeza, felicidade ou sofrimento..."
(Ajahn Chah, monge budista da tradição Theravada)
Cruzei a ponte em direção a Paso de Los Libres. Poucos quilômetros separam minha casa da Argentina, mas os raios de Sol entrando pela janela fizeram parecer uma viagem de carro para longe. Desta vez, no carona. Eu não poderia dirigir com a mão quebrada.
O posto de gasolina na beira da estrada me transportou para um filme qualquer no interior do México (ou do lado norte-americano da fronteira), com aquele ar empoeirado. Minha mente fugiu do momento presente.
Ir até a cidade vizinha é algo bastante simples, basta atravessar a ponte. É a beleza do trivial, do comum. Sonhamos com lugares paradisíacos e fechamos os olhos para a beleza do corriqueiro. Assim como também nos esquecemos do momento presente, sempre remoendo o passado ou fantasiando sobre o futuro.
Segui para as compras. Nada de extraordinário estava acontecendo no mercado, apenas um som de zampona cortando o ar, por entre as prateleiras ("ay, mi vida qué cosa de locos!"). Várias bandeiras da Argentina decorando o local, naqueles dias de Olimpíada. Fiquei pensando: "quem são os atletas olímpicos argentinos?". Mais uma vez, a mente vagou para longe do momento presente.
Saí do mercado. Um grupo de senhores e comerciantes ambulantes tomava Sol na calçada. "Buendía" eles disseram. Respondi com um sorriso e um gesto com a cabeça, ao que emendei: "também li 100 anos de Solidão", enquanto me afastava. Consigo relembrar aqueles passos na calçada, mas não lembro por onde a minha mente andou naquele momento. Talvez longe de terras argentinas.
Entrei em uma padaria para comer umas medialunas (veganas). Nas caixas de som, uma música parecida com "Hungry Like the Wolf", mas cantada em espanhol. Em uma mesa, um clone do Anatoly Karpov tomava calmamente o seu café, enquanto conversava com uma mulher que talvez fosse a esposa dele.
Saí da padaria e entrei no carro. Voltei para casa (de carona). Nada de extraordinário, apenas o trivial. Como a nossa respiração.
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